Pessoas maiores de idade podem, de forma livre, consciente e informada, recusar transfusão de sangue por razões religiosas, e essa negativa só pode ser manifestada pelo próprio paciente, não se estendendo a terceiros.
Como consequência, os religiosos têm direito a tratamentos alternativos disponíveis no SUS (Sistema Único de Saúde), que devem ser custeados em outro domicílio caso não existam no local de residência do paciente.
O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que julgou nesta quarta-feira, 25/9, dois recursos extraordinários com repercussão geral (Temas 952 e 1.069) sobre a possibilidade de Testemunhas de Jeová recusarem transfusões de sangue, e sobre a necessidade de o SUS fornecer tratamentos alternativos.
Os votos dos relatores, ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, prevaleceram. Barroso foi relator do caso envolvendo a adequação ao tratamento; Gilmar relatou o processo sobre a possibilidade de recusa à transfusão de sangue.
No caso de crianças e adolescentes, os pais podem optar por procedimentos alternativos, desde que isso não contrarie a avaliação médica. A discussão sobre o ponto foi levantada pelo ministro Cristiano Zanin e contemplada pelos relatores.
Por fim, médicos podem, por objeção de consciência, se recusar a fornecer tratamentos alternativos. O ponto consta no voto de Flávio Dino e também foi incluído pelos relatores na decisão.
Foi fixada a seguinte tese:
- Testemunhas de Jeová, quando maiores e capazes, têm o direito de recusar procedimento médico que envolva transfusão de sangue, com base na autonomia individual e na liberdade religiosa.
- Como consequência, em respeito ao direito à vida e à saúde, fazem jus aos procedimentos alternativos disponíveis no Sistema Único de Saúde – SUS, podendo, se necessário, recorrer a tratamento fora de seu domicílio.
Incorporação progressiva
A decisão determina que o SUS incorpore progressivamente tratamentos alternativos, além de assegurar procedimentos já existentes. Caso o tratamento não seja oferecido em determinada localidade, hospitais credenciados devem oferecer o tratamento, mesmo que em outro domicílio.
Em um dos processos julgados, o paciente morava no Amazonas, mas se tratou em São Paulo. A despeito de sua especificidade, a decisão deve ter impacto substancial nas políticas de saúde pública, conforme mostrou reportagem da revista eletrônica Consultor Jurídico.
A Corte entendeu que os religiosos podem assinar diretivas de vontade previamente manifestadas, que valem em caso de o paciente não poder momentaneamente manifestar sua vontade, como em um episódio de inconsciência.
Ao todo, ficou definido:
Testemunhas de Jeová podem recusar transfusões, mas a manifestação de vontade deve ser proferida por um paciente maior de idade, capaz, e em condições de discernimento;
a manifestação tem que ser livre, voluntária e autônoma, sem nenhum tipo de coação;
deve ser inequívoca. Ou seja, feita de forma expressa, prévia ao ato médico;
em caso de impossibilidade de manifestação, em episódios, por exemplo, em que o paciente está inconsciente, vale diretiva antecipada de vontade, caso ela exista;
a manifestação tem que ser esclarecida. Ou seja, precedida de informação médica completa e compreensível sobre o diagnóstico, tratamento, riscos, benefícios e alternativas;
médicos não são obrigados a aplicar tratamento alternativo, podendo recusar métodos que não sejam a transfusão, e não podem ser responsabilizados;
a manifestação de vontade vale para cada pessoa, não sendo possível decidir por terceiros;
No caso de crianças e adolescentes, os pais podem optar por outro tratamento considerado igualmente eficaz, desde que não contrarie a avaliação médica.
Fonte: Conjur